Do verdadeiro querer
É quando nós nos perdemos dos outros, que um leve e epidémico desespero habita o peso de cada objecto. Todos os objectos mortos pelo corpo, morrendo-nos o corpo pelos objectos ... Onde foi que nos desencontramos? É por nós mesmos que nos damos a tanta morte?
Porém daquela alma fora de nós, (nós daquela Alma) são agora mais nítidos todos os fragmentos de música... Que estranho e triste contra senso...parece-nos que a alma ganha gravidade sobre a respiração, de tanto suster o fôlego, nós, estupidamente alegres e imersos na matéria colorida e morta daqueles mil objectos. Morrerem-nos assim as horas, tendo todo o peso da alma sobre o coração.
E a insistência daquela voz, da Voz, que por vezes ouvimos de nós para nós, objectos...que tens no pulso, tu? Horas que se esvaem...não cumpres o sangue que te corre, não te importas dele, cumpres as horas e as horas só, que se esvaem pelos pulsos, tu objecto de ti mesmo, digo-te... deixaste que as palavras te morressem na boca, e na boca de sede te morreram...porém, aquela música...
Digo-te: numa segunda camada de ti e de quem amas, uma só de vós mesmos...numa segunda camada por sobre a morte a que te abandonaste, nessa segunda camada, celebra uma palavra... Diz-lhe, a quem amas: aproxima-te de mim, aproxima-te e diz-me quem tu és, tu único, belo, só tu, diz-me uma palavra de ti e para ti, canta-me essa palavra no espaço do nosso silêncio, só nosso, o nosso íntimo silêncio...e do que morre por sobre nós nada nosso será, do que morre por sobre nós nada sentido terá; diz-me, amo-te por quem sou, e por quem és, amo-te porque é no Amor, e só no Amor que o corpo me não morre, amo-te porque nada mais importa senão o nosso íntimo silêncio, aquele por onde ressoará a verdadeira música quando sentir mais uma vez as tuas mãos sobre o meu rosto...ali, por onde tudo é habitado senão de nada...de nada para além de nós mesmos, nada, absolutamente nada para além de nós mesmos, de mim e de ti, é lá que caminhamos na Paz, onde tudo é feito de nada; onde tudo de nada ser, renasce no sentido pleno do nosso verdadeiro querer.